segunda-feira, 26 de março de 2012

O Feiticeiro de Angarack








Este é o primeiro capítulo do livro que estou escrevendo.
Quem puder opinar, seja criticando ou elogiando, eu agradeço!








Sinto o peso das palavras a cada vez que as escrevo aqui.

É como se os mortos estivessem ansiosos por elas e as vidas perdidas no passado estivessem à espreita, aguardando uma oportunidade de reviverem tudo novamente. De se sentirem vivas, uma vez mais. Através destas palavras, creio eu, estas pessoas se tornarão imortais.
Nada me dói mais do que reviver aqueles dias. Reviver as batalhas, as intrigas, os jogos de poder e acima de tudo, a Grande Noite. Porém, jamais me perdoaria se o mundo não soubesse o que aconteceu lá e tudo se perdesse com o tempo. Houveram sim, coisas ruins, mas muitas coisas boas aconteceram. Boas pessoas viveram e morreram.

O bem sempre vence o mal.

Era o que meu pai sempre dizia. E eu o amaldiçoo sete vezes, por me contar tais mentiras. E amaldiçoo mais ainda, pais que iludem seus filhos com estas tolas estórias. Esta estória que aqui descrevo agora, não é como as outras. Toda estória tem um começo e um fim. O que vem no meio é o ápice de tudo, levando à todos a um fabuloso final. Mas esta... Esta é uma estória às avessas. Ela teve um fim trágico e uma longa, longa jornada em busca de um começo. Porém, para entende-la da maneira correta, é necessário voltarmos muito no tempo. Até a época em que tudo seria criado.
No início não existia nada, somente o Vazio e no Vazio vivia Allaff, o Criador. Não existia palavra para Céu ou Terra, Mar ou Firmamento. Lá, só existia o Silêncio. Durante séculos incontáveis ele vagou pelo Vazio em busca de inspiração e nunca a encontrou. Porém, em uma das incontáveis vezes em que ele meditou procurando algo em sua mente, ele encontrou o que procurava. O sonho veio como se tivesse sido sussurrado em seus ouvidos e sua mente deu ao sussurro forma. Em seu sonho era tudo tão lindo. Ao acordar, estava decidido que iria dar aquele sonho a chance de se tornar real e assim, o  Verbo fora entoado pela primeira vez. A voz do criador entoou o Verbo e ele se tornou tudo o que poderia ser. Sonho e Idéia. Esperança e Medo. Do Verbo, um pequeno Globo surgiu em meio ao Vazio e o Criador deu à ele o nome de Varda.

Conforme o Verbo era entoado, eras e eras iam dançando em frente à Allaff, tamanha era a perfeição de seu mundo. Porém, ele não imaginava o quanto o Verbo era poderoso e traiçoeiro e este foi seu maior erro. O Livro de Ebenezer conta que Allaff não sabia ao certo o que fazia quando entoou o Verbo pela primeira vez. Espíritos antigos que vagavam invisíveis pelo Vazio, ao ouvirem o Verbo foram tentados por ele e assim foram criados os primogênitos. Os filhos de Allaff, todos Elcariuns como ele, Deuses com o Dom da Criação. Um a um, foram surgindo e suas vozes se unindo à do Pai entoando o Verbo. Allaff estava surpreso com aqueles seres que haviam surgido e só então percebeu que ele havia dado fim à aquilo que ele mais detestava em sua existência. A Solidão. Ele nomeou um por um dos filhos que havia criado. O primeiro e mais poderoso dos Elcariuns foi Nagrók, logo em seguida surgiu Zulan, Heliel, Lelian e Jakopo, respectivamente. A voz do Pai se elevou no Firmamento e ele disse:

A minha forma e semelhança vos criei e lhes concedo autoridade sobre tudo o que existe... Que por meio de Sua vontade, se cristalizem todas as coisas.

Lelian ergueu sua voz e entoou o Verbo e um imenso Palácio Dourado e Prata surgiu no Firmamento e seu brilho iluminou Varda e revelou  que ainda estava inacabada. Zulan criou  grama em volta do Palácio e Heliel e Jakopo criaram árvores e lagos e tudo ali seguia um padrão, tudo ali era perfeito. Um dos filhos porém, olhava cobiçoso para o pequeno mundo abaixo deles e sua voz entoou o Verbo para moldá-lo e naquele momento, Varda ficou sujeita à sua Vontade. E a vontade de Nagrók era insana. Ao comando de sua voz, as montanhas se ergueram do chão e foram subindo mais e mais, algumas realmente tocavam o céu e aquilo deixou o Pai maravilhado e sua atenção se voltou ao Primeiro Filho. Da Pedra nas Montanhas, Nagrók criou os anões, criaturas de tamanho mediano e brutos. Eram grandes trabalhadores e acima de tudo amavam a pedra, ao qual chamavam de Deusa. Sem que ninguém percebesse, Nagrók implantou nos anões um sentimento, cobiça sobre todas as coisas Valiosas. E assim, nasceu o Primeiro Pecado no Mundo.
Os bosques foram criados em seguida e das árvores criou-se os Elfos, altivos e soberbos  e extremamente poderosos. Amavam o Poder acima de tudo e fariam qualquer coisa para protegê-lo ou se tornarem mais fortes. E assim, fora criado a Inveja e o Ódio, pois um sempre vem acompanhado do outro, e mais Pecados vieram ao mundo. Nas florestas, vários animais foram criados, para que servissem de alimento para aqueles que acabavam de ganhar vida. Tudo seguia seu padrão e aos poucos, os Elcariuns iam se unindo ao irmão mais velho e foram criando coisas no mundo que o Pai há pouco havia criado. Um a um foram pincelando suas idéias, mas sempre que um deles erguia a voz, Nagrók erguia a sua mais alto e deturpava aquilo que os irmãos criavam ou simplesmente destruía. O pai, maravilhado com tudo o que via não prestou atenção no que os Filhos faziam e assim, a primeira Guerra fora travada. A Guerra da Criação, como foi chamada. Nagrók vencera os irmãos e o Verbo o influenciava à cada vitória. Em Varda, os recém criados, Elfos, Anões e Animais, assistiam àquele espetáculo que se desenrolava diante deles. Uma tempestade se formou e um raio caiu sobre uma árvore, incendiando-a. O fogo fez com que os Elfos se assustassem e fugissem da Floresta, com medo de queimarem. Aquele Poder era forte demais e eles não ousavam desafiá-lo. Névoa subiu das planícies e cobriu tudo, se misturando com a fumaça. A escuridão era absoluta, exceto pelas áreas que pegavam fogo. O mundo que era tão belo estava se destruindo pela briga entre os Elcariuns. Fogo, Névoa e Sombra. Era nisso que o Mundo havia se tornado. E desses três elementos, Nagrók criou seu servo mais poderoso. Os Elcariuns se assustaram ao verem que ele se elevava mais e mais e seus olhos em chamas os encaravam. Naquele momento, nascia Vulgort. Somente neste momento Allaff percebeu o que estava sendo feito de seu mundo e interferiu naquilo que os filhos faziam.
Dei a vós livre arbítrio para criarem o que bem desejassem, porém o que vi foi somente Destruição e Morte.

Vulgort desapareceu naquele instante e nunca mais foi visto, desde então. Nagrók olhou para suas mãos e as apontou para o Pai.

Tu me destes o Poder da Criação, Pai. Tu me criastes e colocaste em minha mente tudo aquilo que criei. Porque me acusas agora?

Allaff não respondeu. Ele não sabia exatamente do que o Filho o acusava e preferiu não responder de imediato á sua pergunta. Seria ele mesmo o culpado por aquela destruição?

Tu te calas e não me responde. Não sabes a resposta? Temos como saber exatamente o que criamos ao entoarmos o Verbo, PAI. E se tu não sabes disso, então não mereces ser o Primeiro entre os Elcariuns.

Os olhos de Allaff brilharam e sua voz soou como trovão e todos em Varda puderam ouvi-lo, mesmo que tapassem os ouvidos.

Tu não és digno de ficar em minha morada. Semeaste ódio e guerras em tudo aquilo que criei e em pouco tempo, tu destruíste grande parte do Plano que tinha para este lugar. Porém, nem tudo está perdido.

Nagrók não entendia o que o Pai dizia e o ódio que havia acabado de criar no Mundo tomava conta dele secretamente e pouco a pouco ia roendo as amarras da razão, dando lugar à loucura. O Pai estendeu sua Vontade para uma criatura que jazia morta no chão e dela retirou dois pedaços de carne e deu á elas vida. Ali, naquele momento, eram criados os humanos. A raça mais jovem de todas. Embora o Verbo tenha sido entoado por cinco horas somente, em Varda passaram-se quinhentos anos. A maior Guerra pela qual Varda havia passado era a Guerra da Criação e vários Elfos e Anões deixaram seus registros sobre ela.

Estes, são meus novos filhos e neles coloquei o Fogo Inextinguível. Por mais que o Mal que tu semeaste no Mundo seja forte, a chama dentro deles jamais se apagará e eles lutarão e o impedirão de cumprir com sua maldade. Estes são MEUS filhos e com eles eu deixo a minha graça.

O ódio de Nagrók explodiu em fúria e fogo e o céu ficou vermelho quando ele gritou. Em Varda, seus servos, ou aqueles que haviam sido tocados pelo mal, caçaram os recém criados de Allaff, porém eles haviam desaparecido. O Pai os havia escondido até que tivessem número suficiente para reivindicar um lugar no mundo.

Tu não sabes o que faz. Pensas que pode comigo, mas eu sou o Primeiro dos Elcariuns. Eu sou DEUS e nenhum de vocês pode me destruir ou destruir aquilo que criei naquele Mundo. Aquele lugar me pertence e nenhum de vocês vai tocar nele novamente.

Os primogênitos foram atacados pelo fogo de Nagrók e o Pai os protegeu dirigindo seu olhar ao Filho.

Tu me tomas como ignorante, Filho. Mas sois tu que não sabes o que faz. Tua Vontade se instalou em minha criação, porém eu irei erradicá-la de lá nem que isso demore Milênios. Pois eu sou Allaff e aquilo que foi criado sobre a minha vontade estará eternamente sujeita a mim. O mal que tu criastes se espalhará pelo mundo, matando, corrompendo, torturando, porém deixo aqui um aviso para aqueles que seguirem as palavras da Serpente que tenho como filho. A danação eterna é o que os aguarda e agora, lhes mostrarei meus novos Filhos.

Um raio caiu na terra e a rasgou ao meio e dentro dela puderam ver o fogo. Das rochas em volta dele, Allaff criou criaturas disformes com chicotes e espadas em chamas.

Todo aquele que esquecer minhas palavras e se sujeitar ao Mal que corrompe o mundo, terá estas criaturas como recepcionistas em sua eternidade de danação.  E a ti, meu filho, está reservado o pior dos destinos. Tu viverás naquele mundo que corrompeu, ele é teu como disse e nele passará a eternidade. Tiro de ti agora, o dom que lhe dei e deixo a ti somente a imortalidade como presente e castigo. Assistirá as eras se desenrolando diante de ti e verá seu mundo se corromper ao longo dos anos. Porém, lembre-se. Tudo teve início em  mim e a mim tudo voltará. Aqueles que forem bons em vida, virão à mim e viverão comigo, até que o próprio Tempo não exista mais, até que reste somente você em um mundo devastado pela sua Vontade. Eles viverão e morrerão, porém tu, jamais terá o Descanso Eterno. Jamais voltará para casa.
                                                         
Nagrók estava com ódio e isso era evidente pelo seu olhar insano.

Tu não podes me banir daqui... PAI. EU SOU O MAIS PODEROSO. O MUNDO RESPONDE SOMENTE A MIM.

Imensas asas surgiram nas costas de Nagrók e ele foi para cima do Pai. A cada investida e soco, um raio riscava o céu e os Elcariuns se tornavam visíveis. Allaff somente bloqueava os golpes do filho e nenhum dos irmão se atreveu a entrar naquela briga. Um raio riscou o céu e parou nas mãos de Nagrók e ele o usou para cortar fora o braço do Pai. O sangue era dourado e escorria pelo jardim recém criado.

Banido serás, meu filho. E jamais voltará para casa.

Antes que Nagrók pudesse dizer algo, Allaff subiu em suas costas e o arremessou em meio à terra. O foço que havia acabado de criar estava fechado e Nagrók estava agora, sem poderes. Porém, ele ainda era forte e malicioso o suficiente para sobreviver em Varda. E ele sorria, olhando para os céus desafiador, sabendo que sua Vontade havia se cumprido. Ali, ele jurou vingança aos Elcariuns. Um dia eles seriam seus escravos e ele os torturaria por toda a eternidade.  A voz de Allaff se elevou uma última vez e depois, se calou para todo o sempre.

Não mais interferiremos no Destino do Mundo, pois do Verbo só trouxemos desgraças. Os meus filhos de carne logo estarão fortes e eles guiarão o mundo para sua Salvação ou Destruição. Até lá, assistiremos impassíveis o que tiver que acontecer e esperaremos de braços abertos todos aqueles que por sua bondade em vida, conseguirem achar o caminho até meus Portões.
Haverá um tempo, onde aqueles que desafiam os Elcariuns, conhecerão a Cólera dos Céus. Campos e bosques arderão.
Os mares se abrirão e lavarão os impuros, engolindo-os para sempre.
O vento separará as nações de Varda.
E o raio do Pai rasgará os céus.
Muitos clamarão seu falso Deus e nada obterão além de silêncio.
Neste dia, o fim estará próximo.

E assim foi feito. Os Elcariuns nunca mais interferiram em Varda, ou não diretamente. Enquanto isso, Nagrók se tornava mais e mais forte e era conhecido como Deus. Temido por uns  e amado por muitos. Porém, seu reinado teve fim quando os humanos se revelaram do esconderijo que Allaff havia lhes dado e Alacaster Thúrunnen, aprisionou aquele que não podia ser morto e com a ajuda dos Seis Conselheiros representantes dos Elcariuns em Varda, selaram para sempre o Poder da Serpente. Alacaster se tornou Rei e sua família ficou destinada a proteger Varda para sempre. Porém, Nagrók havia jurado que destruiria os Elcariuns e tomaria o mundo novamente para si. A roda das eras girava e girava e ele aguardava até o momento certo em sua prisão. O momento de libertar Vulgort do anonimato e mostrar para todos seu maior servo, o medo encarnado. Os Elcariuns seriam seus escravos e os humanos sofreriam.

E este dia chegaria. O dia em que ele cumpriria sua promessa. E neste dia, não sobraria nada... Nem mesmo a Esperança.

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