quinta-feira, 29 de março de 2012

Escolher o Caminho


    







 O cheiro era diferente de tudo o que já havia sentido. Uma mistura de temperos, doces e carne putrefata. Nada era palpável, tudo parecia surreal. E ao mesmo tempo, tudo parecia estar realmente ali. Os tijolos amarelos se estendiam por quilômetros e quilômetros e se perdiam no horizonte, tanto a norte, quanto a sul. Os corpos estavam jogados por todos os lados. Árvores já criavam suas raízes por cima deles e a grama já cobria a outra parte. Era estranha aquela visão. Mortos, mas sem se decompor. Eram centenas de milhares de corpos e estes também se perdiam no horizonte. Aqueles eram os restos de uma batalha antiga, travada nos primórdios do mundo. O tempo ali parecia não passar nunca e em contrapartida parecia estar se acelerando, parando e regressando novamente. O ar era pesado, o cheiro estranho e o caminho desolado.

- Para onde devo ir? – perguntou ele.

- Para frente. – respondeu uma voz que não pertencia a nada e a ninguém, mas vinha de tudo e todos os lados.

- Onde é a frente?

- Onde não for atrás.

     Óbvio. Mas qual caminho tomar? Sul ou Norte? Qual era o caminho para frente? Era isso que ele pensava naquele momento e vários xingamentos passavam por sua mente atrapalhando sua decisão. Por fim, resolveu ir para o sul. As estradas eram idênticas, feitas de tijolos amarelos e com cadáveres e árvores ás centenas se aglomerando á sua volta. Algumas das árvores lhe davam medo. Elas tinham rostos desenhados no tronco e estes rostos eram terríveis. Era como se expressassem o sofrimento eterno a que haviam sido sujeitas. O caminho estava cheio disso. Sofrimento. E este não era uma boa companhia quando se caminhava num lugar desconhecido.
Desconhecido para muitos, mas para ele, nem tanto. Ele visitava aquela estrada desde que tinha dez anos e desde então, nunca tivera muita sorte no caminho de tijolos amarelos. Lembrava-se da primeira vez que havia estado ali. O caminho o assustava como sempre o fizera desde então, mas havia um homem (ou seria uma mulher?) parado em frente à uma destas árvores.

- O-onde estou? – perguntou a pobre criança.

- Você está aqui.

- E onde é aqui?

- Aqui é onde tem que ser e onde sempre foi. Mas pode ser que não seja, ou que talvez nem tenha sido. Pode ser que não tenha estado aqui e talvez nunca esteja. Bom, este é o lugar em que você está e é aqui, exatamente aqui, que tudo começa.

- O que começa?

- O início.

- Sim, início e começo são a mesma coisa.

- Talvez tenham o mesmo significado, mas se fossem a mesma coisa não seriam palavras diferentes.

     Aquilo o deixou confuso. Tinha somente dez anos e aquele cara (ou mulher) o estava deixando irritado com aquela conversa de loucos.

- Porque estou aqui?

- Por que tem que estar.

- Você vai me responder tudo desta forma?

- As respostas nem sempre são tão objetivas quanto as perguntas, mas muitas vezes, podem significar mais do que aparentam.

- Não entendi.

- Não esperava que entendesse. Você está aqui para escolher.

- Escolher o que?

- O caminho para frente.







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